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PORQUÊ O VEREADOR AGE COMO PREFEITO? A HISTÓRIA EXPLICA

Grupos do Facebook que debatem e discutem os problemas socioculturais e políticos de Taubaté, manifestam um inconformismo com as ações e atitudes dos vereadores da Câmara Municipal de Taubaté

Publicada em 01/12/24 às 16:56h - 39 visualizações

por João Angelo Guimarães


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 (Foto: JPB Estúdio Mix)











PORQUÊ O VEREADOR AGE COMO PREFEITO?

A HISTÓRIA EXPLICA.

 

Prédio da Câmara Municipal de Taubaté - 1906

 

Todos os dias nos grupos do Facebook que debatem e discutem os problemas socioculturais e políticos de Taubaté, se manifesta um inconformismo enorme de cidadãos, com as ações e atitudes que assumem os vereadores da Câmara Municipal da cidade.

 

Não faltam juízos de valor quanto à atuação dos vereadores na proteção dos direitos de eleitores e cidadãos. Principalmente quando as iniciativas da administração municipal, do prefeito que gerencia a cidade, causam prejuízos financeiros ao erário municipal, e a má aplicação do dinheiro de impostos nos serviços públicos.

 

A título de exemplo, a dívida municipal consolidada de Taubaté, ou seja, os “papagaios” deixados para o próximo prefeito pagar a partir de 2025, é a bagatela de mais de 750 milhões de reais, montante esse que chega a ser quase a metade da arrecadação anual da prefeitura nas receitas de Taubaté. Serviços que foram contratados, compras que foram feitas, e via de regra, o prefeito de plantão deu o calote nos fornecedores e não pagou.

 

E o que fazem os vereadores? Ao invés de fiscalizarem os atos do executivo e apontar e denunciar os descalabros da prefeitura, eles se alinham unanimes, concordam e votam a favor do prefeito, como aconteceu no caso escandaloso do empréstimo que um prefeito fez em nome de Taubaté junto ao CAF, onde pegou 60 milhões de dólares e investiu em obras, que foram iniciadas e inacabadas, que não surtiram qualquer melhoria para a cidade, deixando uma dívida duas vezes maior para os próximos prefeitos pagarem.

 

Enquanto isso, vereadores assumem a tribuna da Câmara Municipal para pedir lombadas, radares, consertos de buracos, dar nomes a ruas, dar títulos de cidadão e comendas aos seus amigos e conhecidos e prometer que vão construir postos médicos, escolas, creches, e por aí vão a prometer ao eleitor beócio e ignaro das funções legislativas do vereador, as coisas que não competem ao exercício do nobre edil.

 

Será que esse vereador eleito pelo povo não sabe que executar obras e administrar a cidade é prerrogativa do poder executivo? Ou esse vereador sabe disso e age de má-fé para ludibriar o incauto eleitor para se eleger? Ou ainda, esse vereador é apenas um prefeito frustrado?

 

De certa forma, essa atitude dos vereadores de quererem ser e agir como um prefeito pode ser explicada pela história do nosso país, uma vez que a função executiva de administrar uma cidade como um poder próprio só foi criado depois do golpe militar da proclamação da república de 1889. Para explicar tudo isso, novo parágrafo, e um aviso, lá vem “textão”, se não quiser ler, pare por aqui e volta para os grupos do WhatsApp.

 

Descoberto o Brasil em 1500 (não foi bem uma descoberta, uma vez que já se sabia que ele existia), levou 30 anos para que a primeira expedição colonizadora portuguesa tomasse posse das terras brasileiras, com Martim Afonso de Souza fundando a primeira vila do Brasil, São Vicente, em 1532.

 

Resumidamente, para uma aldeia receber o foral de vila, construía-se uma capela e instalava-se uma casa de câmara, cadeia e pelourinho, para exercer as funções legislativas, executivas e judiciárias. Eram eleitos em voto censitário os “homens bons”, título que recebia os vereadores ao assumir seus postos na administração da vila. Basicamente, nesse primeiro momento do Brasil Colonial, os vereadores não faziam as leis, pois essas eram importadas da metrópole, e os agentes do rei e da coroa se incumbiam de as fazer valer. No âmbito local, os vereadores cuidavam da aplicabilidade dessas leis e normas, exercendo o poder de polícia e o poder de julgar e enquadrar os habitantes de acordo com as transgressões praticadas.

 

As câmaras seriam formadas por juízes ordinários, vereadores, procurador e almotacé, ofícios honorários, geralmente eleitos e, em princípio, não remunerados. Além destes, havia o escrivão da câmara, o escrivão da almotaçaria, o tesoureiro, os tabeliães das notas, os tabeliães judiciais, os inquiridores, os distribuidores, o alcaide-pequeno, o porteiro, os contadores de feitos e custas, os solicitadores, o escrivão das sisas, os quadrilheiros, o carcereiro, o meirinho, o juiz dos órfãos e o escrivão dos órfãos. Em algumas câmaras existiam outros oficiais eleitos, como um juiz para cada ofício, também chamado de “juiz do povo”, e o afilador, encarregado da fiscalização dos pesos e medidas.

 

O papel administrativo assumido pelos vereadores, entre outras funções, era o de determinar os impostos, fiscalizar os oficiais da municipalidade e a aplicação da lei pelos juízes ordinários, zelar pelas obras e pelos bens do lugar, vistoriar as contas do procurador e do tesoureiro, determinar os preços de alguns produtos, os ordenados dos oficiais mecânicos, jornaleiros e moças de soldada, lançar fintas, além de despachar com os juízes os feitos provenientes dos almotacés.

 

O procurador, tinha atribuições relativas à administração das rendas e das demandas da municipalidade, cuidando dos reparos e consertos de casas, fontes, pontes, chafarizes, poços, calçadas, caminhos e outros bens, além de servir como tesoureiro onde não houvesse esse ofício. Encarregado de verificar o abastecimento e o respeito às posturas e vereações, o almotacé também tinha a competência de despachar os feitos relacionados à sua área de atuação, cuidar da limpeza da cidade e fiscalizar a realização de qualquer obra.

 

Esse poder discricionário superlativo das câmaras municipais do Brasil-Colônia durou até a independência em 1822, quando a constituição de 1824 determinou que as câmaras municipais fossem compostas por vereadores, competindo-lhes o governo econômico e municipal de vilas e cidades, excluindo, portanto, a função judicial de sua esfera de atuação. Mudanças mais profundas foram definidas pela lei de 1º de outubro de 1828, que modificou a forma das eleições e reiterou o caráter estritamente administrativo das câmaras municipais.

 

Com o golpe militar da proclamação da república, as câmaras municipais são dissolvidas e os governos estaduais passam a nomear os membros do "conselho de intendência". Em 1905, cria-se a figura do "intendente", que seria o protótipo inicial do prefeito, assumindo para si as responsabilidades da administração municipal.

 

Prédio da Intendência Municipal (Prefeitura) - 1908

 

Já no golpe militar da revolução de 1930, Getúlio Vargas cria as prefeituras, às quais serão atribuídas as funções executivas dos municípios. Assim, as câmaras municipais passaram a ter especificamente o papel de casa legislativa, perdendo totalmente o controle administrativo e financeiro das cidades. No golpe do Estado Novo, com o poder arbitrário de Vargas, entre 1937 e 1945, as câmaras municipais são fechadas e o poder legislativo dos municípios é extinto. Com a restauração da democracia e a deposição de Getúlio Vargas em 1945, as câmaras municipais são reabertas e começam a tomar a forma que hoje possuem. Por isso, as legislaturas são contadas em ordem progressiva a partir de 1948, quando foram eleitos os vereadores para a primeira legislatura.

 

Então, concluindo, pode-se depreender que, conforme diz o velho aforismo - “O vício do cachimbo faz a boca torta”, por causa das câmaras municipais brasileiras terem sido criadas com a função executiva, ficou no imaginário político o resquício de que o vereador é um alcaide-pequeno, função que existia no Brasil-Colônia, e que era apenas um executor de ordens.

 

E já que o espírito de corpo, a consciência de classe existe e muito nesse meio político, a tendência é sempre agir da maneira mais proveitosa na manipulação desse poder, aproveitando que o brasileiro médio é totalmente ignorante, “burro” mesmo no quesito de entender e interpretar leis. E políticos assistencialistas, populistas, dissimulados e demagogos fazem questão de manter essa massa de manobra totalmente subserviente às suas vontades. Com isso, podem manter manietado o prefeito em seus ardis políticos, negociando cargos e benesses em troca dos votos em projetos de autoria do executivo.

 

Vamos aos números. Um vereador de Taubaté tem direito a um subsídio no valor de até 60% do que ganha um deputado estadual de São Paulo. O ano que vem, os deputados da ALESP vão receber pouco mais de 33 mil reais. Assim, um vereador de Taubaté poderia receber mensalmente 19.800 reais, já o valor bruto que será pago em 2025 é de 12 mil reais. 

 O orçamento da Câmara Municipal para gastar em 2025 é de 45 milhões e seiscentos mil reais. A lei permite que o gasto com o legislativo pode chegar a 5% do orçamento anual das receitas do munícipio. Se levar em conta o orçamento total, somando prefeitura, Unitau, fundações e IPMT, chega a mais de 2 bilhões e quinhentos reais. Se considerar apenas a receita da prefeitura é de pouco mais de 1 bilhão e 800 mil reais. Pela conta menor, a Câmara de Taubaté pode consumir até 93 milhões de reais.
 

A galera que posta no Facebook chia à vontade quanto a esses exorbitantes números orçamentários da despesa da câmara, tanto dos “salários” dos vereadores, quanto ao gasto da máquina legislativa. Só que, independente da chiadeira, esses números são legais e constitucionais, e o dia que a patuleia política resolver mesmo enfiar a mão no orçamento municipal, não vai ter choro e nem vela, vão continuar dentro da legalidade jurídica e constitucional.

 

De novo, voltamos a bater naquela surrada tecla, se a Câmara Municipal de Taubaté não cumpre a sua função constitucional de proteger seus cidadãos da rataria política e dos desmazelos financeiros, de quem é a culpa?

 

Dos vereadores? Pensamos que não! Nenhum dos 19 vereadores usurparam qualquer cadeira, ou tomaram posse ilegalmente de qualquer mandato de 4 anos. Lá foram colocados pela força do voto de uma parte dos mais de 210 mil eleitores taubateanos. Pode-se até acusá-los de enganadores, burladores da fé popular, charlatães e picaretas, mas com certeza o povo os escolheu para ser a sua voz e a sua representação popular do poder legislativo. Afinal, diz-se milenarmente que cada povo tem o governo que merece.

 

Não menosprezamos o trabalho dos cidadãos vigilantes e conhecedores do rito político e legislativo, que por fim acabam fazendo o trabalho de verdadeiros vereadores sem mandato, denunciando as picaretagens políticas de prefeitos e vereadores saídos de igrejas, de padarias, do setor público, das rádios, das profissões liberais, do agronegócio, do ramo político e de qualquer outro nicho ou curral eleitoral manipulável, como as comunidades periféricas que sofrem com a ausência do estado na prestação dos serviços públicos essenciais, povo semianalfabeto e sem acesso às informações privilegiadas.

 

Mas, contudo, acaba sendo uma chicotada no mar o trabalho desses personagens altruístas, pois o povaréu vai continuar colocando essa trempe interesseira, trabalhando apenas para o bem-estar próprio. E mesmo que alguém imbuído de boas intenções consiga ter um mandato, dificilmente vai conseguir prevalecer sobre a alcateia estabelecida lá, e será a voz que clama no deserto.

 

Ao eleitor taubateano, com certeza, não falta apenas o conhecimento sobre leis e sobre seus direitos fundamentais. Falta também uma certa vergonha na cara para deixar de colocar seus asseclas e amiguinhos como vereadores, numa função tão importante quanto a de quem fiscaliza o uso do dinheiro público dos contribuintes por parte do gerente-mor da cidade, o prefeito, responsável também pelo futuro e conforto de mais de 310 mil taubateanos, moradores dessa quase quadricentenária cidade.

 

Parem de colocar o rato para tomar conta do queijo!





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