O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anunciou no início da noite desta quarta-feira (2) a redução em 0,5% da Selic, a taxa básica de juros, que foi de 13,75% para 13,25%. Trata-se da primeira redução em 3 anos, conseguida após uma série de melhoras nos índices econômicos do país e meses de debates acalorados entre o Governo Lula e Roberto Campos Neto, presidente do BC. No entanto, apesar dessa primeira redução, o Brasil ainda é o país com a maior taxa do mundo.
A princípio, o BC, presidido por Roberto Campos Neto, que foi indicado por Jair Bolsonaro, sustentava que a taxa de juros nas alturas seria necessária por conta da suposta inflação alta. Mas nos últimos meses o Brasil melhorou seus indicadores econômicos, registrando queda inflacionária, crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), valorização do real e aumento da perspectiva da nota de crédito no cenário internacional. É o que explicou, com exclusividade à Revista Fórum, o economista Marcelo Manzano, doutor em desenvolvimento econômico e professor do Instituto de Economia da Unicamp.
“É muito bem vinda a redução da taxa básica de juros, embora tardia. Isso já poderia ter sido feito no início do ano, e já havia claras condições. Infelizmente o Banco Central insistiu numa perspectiva de que a inflação brasileira fugia ao controle, com tendência de aceleração, mas esse primeiro semestre mostrou que o BC estava errado”, avaliou Manzano.
O economista aponta que a taxa de inflação veio caindo no primeiro semestre e que as projeções para os próximos 12 meses, que é o que o BC leva em consideração para determinar a taxa de juros, mostram a inflação estará dentro da meta estabelecida para o ano que vem. Para o economista, é importante que a taxa continue caindo, pois apesar da queda, ainda termos a maior taxa de juros de mundo.
Marcelo Manzano, doutor em desenvolvimento econômico pela Unicamp. Arquivo Pessoal.
“Mais do que qualquer coisa, ter a maior taxa de juros do mundo indica a falta de coerência do Banco Central brasileiro, que mantém as taxas elevadas quando o país está longe de ser aquele com a maior inflação do mundo”, agregou.
Por que o Governo Lula previa redução
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que desde o início do ano vem fazendo pressão pela queda do índice e tecendo críticas a Roberto Campos Neto, falou nesta quarta-feira, antes da nova decisão do Copom, sobre a demora em se reduzir a taxa. "Esperamos que hoje o Copom tome a decisão que já deveria ter tomado a três reuniões atrás de reduzir a taxa de juros, porque não tem explicação", havia declarado o mandatário.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também afirmou, pela manhã, que esperava uma queda na taxa de juros de pelo menos 0,5 ponto percentual. Após o anúncio da redução da taxa de juros para 13,25%, Haddad voltou a se pronunciar e foi às redes sociais para celebrar a decisão.
Para o economista Marcelo Manzano, a razão pela qual o presidente e o ministro da Fazenda já previam a queda da Selic era bastante óbvia: “Era insustentável o BC manter a taxa de juros em 13,75% mesmo após diversos indicadores apontarem que não há risco nenhum de aceleração da inflação. E o maior indicador é que a inflação caiu a ponto de termos registrado deflação em vários indicadores, seja no IPCA, que é o índice oficial, seja no IGPM, que é o mais utilizado pelos setores produtivos”, explicou.
Em outras palavras, são esses indicadores que explicam, por exemplo, algumas quedas em preços de itens básicos. O professor ainda aponta que já havia de fato um consenso entre diferentes atores da sociedade, desde o governo até economistas e pessoas ligadas ao mercado, em relação a essa queda. Na última reunião do Copom, por exemplo, em sua ata foi mantida a taxa de juros no patamar de 13,75% mas com o indicativo de que seria a última vez que isso ocorreria. Havia meses atrás a perspectiva de que na reunião seguinte, que foi a desta quarta-feira (2), seria possível iniciar um ciclo de redução das taxas de juros.
“Como a economia deu sinais recentes de que perdeu fôlego para o segundo semestre após um primeiro semestre de alta, manter as taxas de juros nesse nível, em um quadro de relativa estagnação da economia, seria uma estupidez ainda maior do que o que vinha sendo, até agora, essa política de juros", completou o professor.
O que muda no bolso dos brasileiros?
Sempre que alguma notícia com tal relevância aparece nos meios de comunicação, surge a pergunta: o que muda no bolso dos brasileiros? Manzano responde que nesse patamar de 13,25%, ainda se trata de uma taxa de juros muito elevada, principalmente no sentido de dar uma folga para o bolso do cidadão comum, que sentirá nesse primeiro momento pouca diferença.
“Como o indicativo do início de um ciclo de quedas, sobretudo para o setor produtivo que vai fazer investimentos hoje para ter retorno nos próximos meses e anos, esse indicador é mais positivo, animador e tende a produzir efeitos maiores. O empresariado, ou alguns dos seus setores, pode avaliar que é chegado o momento de ampliar a sua produção para o futuro, pois o mercado aparentemente deve se aquecer no próximo período", explicou.
Caso esse efeito realmente seja abrangente, é possível que o Brasil registre um aumento na geração de empregos no próximo período. Mas nem tudo é "festa", como alerta Manzano.
“De qualquer maneira vale lembrar que a taxa Selic é o piso das taxas do sistema financeiro. Nem para o empresário, e muito menos para o consumidor, essa queda de 0,5% vai trazer resultados rápidos em termos quantitativos. Enquanto o empresariado trabalha com taxas de 20% ao ano, o consumidor irá pagar nos seus créditos consignados e no consumo, taxas que superam 50, 60 e até 70% ao ano. E aí o 0,5% não significa quase nada”.
Por fim, o economista aponta que a queda na taxa de juros pode significar uma economia bilionária para o governo federal:
“Outro aspecto que não podemos nos esquecer é que em última instância é o governo quem paga o custo da taxa Selic. 0,5% a menos pode significar uma economia de quase R$ 20 bilhões. O governo vai poder deixar de gastar esse valor e essa economia de recursos fiscais pode ser incrementada até o final do ano se a tendência de queda da Selic se mantiver”, concluiu Manzano.
Publicado pela Revista Forum